sexta-feira, 19 de fevereiro de 2016

A Lua (Ou Carta XVIII)



- Não entendo senhora, faço de tudo, me esforço, mas as coisas nunca acontecem e quando acontecem nunca são da forma como espero. Fico tentando sempre e nada flui como deveria. Não sei se o problema sou eu ou os outros ou o motivo que isso acontece. – parou por um instante olhando para o chão, com a testa franzida – Preciso de uma luz.

- Não me chame de senhora.

- Sim, tudo bem, me perdoe Grande Avó.

- Você diz que seus planos não fluem?

- Nunca, as coisas não dão certo.

- Entendo. – pegou uma vara e no chão que tinha areia, em frente à fogueira, desenhou um xis e um pouco distante deste, fez um círculo.

- Aqui – apontou o xis – é você, aqui – apontou o círculo – é seu objetivo.

Parou por um instante e olhou de forma profunda para o jovem à sua frente.

- Me mostre qual a melhor forma de se sair daqui - apontou de novo para o xis – e chegar aqui – apontou para o círculo.

Com seus dedos, ele traçou uma linha reta, do xis ao círculo e olhou para ela.

- É isso? – perguntou a velha.

- Sim, de mim ao objetivo.

- Quando você puxa a linha do xis, atravessa a borda do círculo. É isso que você quer? Mudar seu objetivo final? – Com a vara, bagunçou novamente a areia e refez o xis e o círculo.

- De novo.

E ele tentou de novo, puxou do círculo ao xis e ao ser questionado se era isso que queria, que o objetivo fosse até ele, teve sua tentativa novamente apagada. Tentou 18 vezes, e em nenhuma delas o questionamento da anciã lhe parecia satisfatório.

- Não sei o que você quer de mim. – disse o jovem.

- Quero que você olhe todas as suas tentativas, o que restou delas?

- Nada, você apagou todas...

- De novo – fez o xis e o círculo novamente.

Sem pensar, o jovem passou a mão na areia, apagando os dois símbolos e olhou para ela, obviamente frustrado.

- Você precisa ver. – disse a velha, agora sorrindo.

- Ver o que?

- O que há de comum em todas suas tentativas?

- Não sei – e incomodado, passou a mão nas próprias roupas, sujando-as com a areia avermelhada. Percebeu que havia se sujado e ficou mais frustrado.

- Você nem ao menos é capaz de ver o que há ao redor do seu caminho. – sorriu, parecia ter vontade de gargalhar.

- Areia?

- Você sujou suas mãos não foi mesmo? Sujou suas roupas e nem conseguiu atingir o objetivo. – os olhos dela agora brilhavam. – E você não atingiu o que queria por que me ouviu, por que perguntei.

- Você disse que eu estava errado.

- Não, eu perguntei se era o que você queria. Em nenhum momento você afirmou que era. E ainda sujou as próprias mãos, as próprias roupas.

Ele ficou em silêncio olhando para onde estava o xis e o círculo.

- Nossas vontades as vezes são como a Lua, que reflete a verdade do Sol, mas de forma que não percebemos, que não notamos. Ficamos frustrados, por que percebemos o reflexo mas não o que há de fato em nós. E por vezes nos sujamos, achando que estamos de fato, em uma tentativa.

Olhou para ela, pegou uma vara próxima, desenhou dois xis, riscou uma linha entre eles e voltou-se para ela firmemente.

A Grande Avó sorriu.

Dime luna de plata
Que pretendes hacer





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