- Neblina... todos os dias ao anoitecer.
- E o que você acha
disso?
- Não sei dizer... céu azul e sol o dia todo. Anoitece,
neblina.
- Há um equilíbrio
então.
- Não sei... na noite já temos uma visão reduzida e enxergamos
pouco o que está à frente. Podemos tropeçar. Com neblina então, as coisas
tendem a piorar.
- Você precisa avançar
no escuro e na neblina?
- Não. Mas e o sol durante o dia, não há nenhuma nuvem e ele
brilha tão forte e quente. Chega a ser gostoso sentir tocando na pele.
- Então avance sob o
sol.
- Por que não pode ser um avanço completo?
- Você consegue essa
completude dentro de você?
- Eu... não...
- Aproveite o momento
então, e aprenda.
***
Bebericou levemente o café quente
enquanto observava o novo dia chegando. Sol novamente e céu azul, mas sabia que
naquela noite iria vir a neblina. Acendeu um cigarro, às vezes quando faltam
palavras a fumaça preenche o vazio que existe ali. Cigarros são poemas mal
cheirosos.
Foi até o pessegueiro e viu duas
flores próximas, com algumas folhas ao seu redor impedindo uma vista clara.
Arrancou as folhas e pegou o celular para tirar uma foto - com o céu azul ao
fundo, folhagem verde e as duas pequenas flores cor-de-rosa, ficou parecendo um
quadro do florescer da primavera, e já era primavera. Se perguntou se elas se
tornariam pêssegos.
Sentiu uma leve brisa que tocou o
seu rosto, fechou os olhos e viu diante de si uma bela mulher com asas de anjo,
em sua mão direita, um cálice dourado e na esquerda, um prateado. Os antigos
reservavam um nome especial para ela, que representava a união dos céus com a
terra, em uma aliança forjada na bondade e no afeto. Viu a mulher despejar a
água de um cálice para o outro, com um rosto sempre sereno. Por algum tempo
pensava na Temperança como uma carta desmotivadora – esperar, era o que sempre ouvia.
Íris estava ali não para avisar
sobre a espera. Não iria pedir para que ele ficasse em silêncio aguardando a
ação do tempo (que muitas vezes simplesmente não age) ou a ação de terceiros.
Havia passado pelo Enforcado com grande dificuldade, um empurrão feito pelo Carro
para que encontrasse o caminho certo e diante de si, com as asas tão belas, a
deusa estava a lhe mostrar o que significava a Temperança e por que foi
conduzido até ali (sem saber se por ele mesmo ou por obra do destino).
Sentiu-se Iluminado e calmo.
A água passava de um cálice para
o outro enquanto ela olhava serenamente para ele.

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